• Posted by : Testarossa quarta-feira, 27 de outubro de 2021

     


    A ironia narrativa não é um recurso tão usado em animes que não sejam de comédia e sempre foi algo que achei legal de ver. No final do episódio 1 e início deste episódio, vemos a Mato com uma nova resolução, após receber os conselhos da Saya: Ela estava decidida que não iria se machucar. No entanto, infelizmente a vida, sobretudo a vida social, não depende só da gente para funcionar do jeito que queremos. Em poucos minutos essa resolução da Mato foi totalmente destruída, ao marcar um encontro com a Yomi e a mesma não dar as caras, mandando apenas um pedido de desculpas por SMS. Ver a Mato ficar horas esperando a amiga sozinha lá foi doloroso.  O contexto é triste, mas o impacto vem muito da direção, da narrativa visual. Começamos com a Mato se preparando para sair com a ajuda da sua mãe, a expectativa positiva junto da resolução da protagonista, aí já no local a atitude das colegas de classe quando ouvem da Mato que ela está esperando a Yomi te fazem ligar o alerta vermelho. Durante a longa espera, vemos a Mato isolada e pessoas felizes passando pelo local, para depois mostrar os fogos de artificio no momento em que a Mato recebe a mensagem da Yomi pedindo desculpa. Mostrar os pés machucados dela e ela tirando as sandálias para voltar para a casa a pé foi a cereja no bolo.  




    A importância da construção desse tipo de cena é muito alta, visto que isso não só ajuda no desenvolvimento da protagonista, como também torna a influencia na realidade alternativa mais impactante. Conforme o drama e as emoções das três garotas eram descascados, mais certeza tínhamos sobre a conexão entre as duas realidades. A Black Rock Shooter começou apanhando da Chariot (O alter ego da Kagari) devido a cena da casa da Yomi, consegue reagir na luta após os conselhos da Saya, mas volta a ficar em desvantagem quando é surpreendida pelos ataques do alter ego da Yomi, após ela deixá-la esperando sozinha no festival. O anime jogar o conceito dos "sonhos conectados" de duas pessoas que buscam essa conexão para explicar a Mato sonhar com o pedido de ajuda da Yomi te faz questionar sobre a natureza da outra realidade. Afinal, existe, de fato, outro mundo ou o anime realmente quis emplacar essa conexão emocional a nível espiritual entre a Mato e a Yomi? No caso da segunda opção, exige um pouco de suspensão de descrença, mas é uma opção interessante para deixar em aberto o futuro do anime em si.


    Observar a Mato até então é observar uma personagem em um crescimento rápido e verossímil, pois estamos em constante contato com suas emoções e sua personalidade. Me permitindo uma analogia com cores, já que o anime adora isso, é como jogar outras cores em um espaço em branco e ver novas cores se formarem. Ela vem experienciando novas emoções constantemente, seja pela atração que sente pela Yomi, ser atingida pelo ódio da Kagari ou a frustração de ser abandonada pela Yomi no festival, percebemos que ela vai desabrochando lados que não conhecíamos. As outras duas garotas envolvidas no drama, por outro lado, não haviam mostrado muita coisa, mas esse episódio mudou esse panorama ao nos oferecer uma nova perspectiva. Sabíamos que a Kagari era perturbada e que a Yomi era vítima de manipulação emocional, porém, esse episódio deu um novo significado a essas coisas com uma cena muito simbólica. 
    Na noite do festival, vemos a Kagari rindo de um filme aparentemente de violência extrema em uma clara simbolização da sua apatia por terceiros, a Yomi, sentada ao lado, chora por realmente querer ter ido se encontrar a Mato enquanto tricota (Ato que foi o que fez as duas se aproximarem, para início de conversa). A Kagari diz que "deixou" ela mandar uma mensagem, demonstrando seu lado possessivo e, então, oferece um macaron rosa. Sendo amor e afeto as emoções mais ligadas a cor rosa, me causou uma impressão bem forte o momento em que a Yomi rejeita o macaron e a Kagari tenta forçar ela a comer. Após deixar a Yomi emocionalmente abalada, a Kagari oferece seu afeto para "recompensá-la", ela rejeita e confronta a Kagari que, na sua maior demonstração de perversidade até então, força a Yomi a se despir e decide marcar um coração no peito dela com uma agulha. Essa sequência de cenas faz uma clara e evidente alusão a um clássico relacionamento abusivo. 

    O alter ego da Yomi usa correntes para atacar, mas também está acorrentada. Um simbolismo bem direto.

    Quando a Mato vê a ferida da Yomi, ela fica abalada. Mas a passividade da Yomi a deixa frustrada, por ainda não entender o real contexto daquela situação. Após mais uma visita a Saya, nós vemos uma forte mudança de postura da Mato. Ela finalmente decide tomar uma atitude para mudar essa situação, decide confrontar o ódio da Kagari e buscar pela amizade da Yomi. Quando a Mato vai na casa da Yomi, a Kagari decide ir ainda mais ao extremo, se jogando da escada propositalmente para jogar mais culpa para cima da Yomi e forçá-la a ser ainda mais refém dela. Ao que a Mato começou a entender a dinâmica da relação entre a Yomi e a Kagari, ela ganhou mais determinação para agir, o que por sua vez ofuscou toda aquele medo e ansiedade de encarar esse conflito. No hospital, por exemplo, tivemos a lamentável revelação que a própria mãe da Yomi permitia essa relação tóxica porque "coitadinha da Kagari", o que foi devidamente respondido pela Mato ao questionar sobre se o bem-estar da Yomi não importava. A Kagari sofreu um acidente quando criança que danificou sua capacidade de andar, mas aparentemente não foi algo físico e sim um trauma psicológico. Ela então usou do famoso gaslighting na Yomi e a fez acreditar ter a responsabilidade de ficar com ela para sempre. A essa altura, no entanto, a Mato já havia quase tirado a Yomi dessa furada, algo diretamente representado na outra realidade, quando a Black Rock Shooter invade a casa flutuante e acha o alter ego da Yomi dentro de uma boneca velha.



    Depois de todo esse contexto, a cena do quarto do hospital soa bem convincente. A porta está "convenientemente" trancada porque não é só a porta do hospital, são as próprias emoções da Yomi. A Mato insistentemente busca entrar ali, pois é a última barreira que faltaria para ela libertar a Yomi das correntes emocionais que foram impostas nela. Em contrapartida, a Kagari surta de vez, em um desequilíbrio que é a culminação de tudo o que vimos dela até então, de uma pessoa que chegou ao ponto de ferir fisicamente alguém que ela supostamente gosta. Tendo uma mentalidade tóxica de "não posso viver sem você", o que consequentemente agrava sua instabilidade psicológica e, por sua vez, faz seu corpo desenvolver sintomas como a falta de movimento nas pernas, a Kagari ao ver que estava perdendo a Yomi, que descobriu como era ser tratada como um ser humano, entrou em desespero. E tudo isso levou ao ápice da luta na outra realidade.



    Algo que notei é que os macarons que a Chariot usa de munição parecem ser uma representação das próprias emoções da Kagari. No episódio 1 ela derruba calmamente os macarons no rosto da Black Rock Shooter, tal como ela fez na casa da Yomi, lentamente atacando o psicológico da Mato com o seu ódio. Durante a batalha no segundo episódio ela ataca mais frequentemente com seus macarons e quando ela finalmente surta, a quantidade de macarons que a carruagem cospe se torna gigantesca. Como diz aquela velha expressão, ela estava "colocando tudo para fora", e curiosamente a maioria dos macarons eram de cores "feias", como se quisesse dizer que ela carrega muito mais emoções negativas do que positivas. Claro, nesse ponto pode tudo ser só impressão minha, mas acho algo legal para se refletir sobre.
    Surpreendentemente, o confronto entre as três acaba sendo interrompido por uma quarta figura, que abre o chão do espaço da Chariot e captura o alter ego da Yomi antes de sair fora. Não lembrava disso, então me fez pensar um pouco e achar bem interessante as possibilidades. A Black Rock Shooter finalmente derrota a Chariot, decapitando-a e o drama ali entre as três parece, em fim, acabar. De forma esquisita, é verdade, até porque não é só o comportamento da Kagari que muda, mas aparentemente o da Yomi também, e como estávamos na perspectiva da Mato, tal como ela, não sabemos o que realmente aconteceu (ainda).



    No mais, as lutas nesse episódio foram mais longas e deu para ver melhor o quão bem coreografadas elas são. Graças ao surrealismo excessivo daquela realidade e das personagens que parecem não sofrer dano, abre muita margem para a criatividade. A fotografia, direção e o jogo de imagens do anime é incrível, vejam a imagem acima, por exemplo. Não é um anime que é apenas bem produzido, ele vem se mostrando um grande espetáculo visual de maneira geral. A intensidade das cores em cenas chaves, o sombreamento, a fluidez da animação e a atenção aos detalhes trabalham em harmonia para tornar relevante a maioria das cenas do episódio. É realmente impressionante, algo que eu provavelmente deveria focar em comentar quando terminar o anime, mas quis ressaltar isso aqui. Um segundo episódio muito bom, que adiciona alguns pontos de interrogação extras acima das nossas cabeças que eu espero que sejam devidamente respondidos até o final, mas que até aqui vem sendo uma experiência ótima. Vejamos o que vem por aí. Saraba Da!

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