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- Black★Rock Shooter #05 - O Dilema dos Conflitos
Posted by : Testarossa
terça-feira, 2 de novembro de 2021
Se fosse para escolher uma palavra para definir minha experiência pessoal com esse episódio 5, a palavra seria
"inquietante". Inquietante pois foi um episódio que, de fato, não permitiu que minha mente ficasse quieta. Ao longo dos 20 minutos as coisas foram se clareando, permitindo que você conectasse os pontos aqui, percebesse coisas ali, seguindo os com simbolismos e metáforas de sempre, realmente te permitindo enxergar mais amplamente a narrativa até que chega no final e dá a pancada mais forte, com uma grande revelação feita.
Mas, antes de mais nada, se o episódio anterior foi um episódio dedicado a Yomi, esse episódio foi dedicado a Mato, como o título do episódio, "Black Rock Shooter", já deixa evidente. Esse foco era inevitável, uma vez que a "jornada" emocional da Yomi começa na Mato, além da própria Mato ter estado fisicamente distante de todo o drama da construção, ou melhor dizendo, destruição emocional da Yomi. A Yomi simplesmente parar de ir a escola ligou o sinal vermelho para a Mato agir em prol dela mais uma vez, só que a situação era bem diferente agora.
A primeira percepção que me atingiu foi a personagem da Yuu. Meio que em cima da hora, até pelo decorrer do episódio, me veio a realização de que a personagem da Yuu vem em uma crescente interessante desde...o início? Logo mais disserto mais à fundo sobre isso, mas a segunda coisa notável foi a pulseira que a Yomi deu para ela, uma de cor laranja. Se lembrarem, lá na análise do primeiro episódio eu falo sobre o espectro da luz visível e como as cores deles são representadas no anime. A gente tinha a Mato (Azul), a Yomi (Verde), a Kagari (Amarelo) e a Saya (Vermelho), o preto parece exercer uma presença narrativa e estética de forma geral, o que faria faltar apenas duas cores a serem representadas. Uma delas seria a cor laranja, que já havia aparecido na personagem misteriosa de capuz com olhos dessa cor na outra realidade, o fato da Yuu receber essa pulseira me pareceu ser uma dica bem forte de algo que ainda não foi revelado. A última cor seria o roxo que, bem, também dá as caras no final do episódio. Não é coincidência que passamos a ter acesso a todo o espectro visível no anime no mesmo episódio em que a narrativa "põe as cartas na mesa", fazendo suas maiores revelações até aqui.
A Yomi parece agir naturalmente até certo ponto, mas era visível para a Mato e a Yuu que tinha algo de errado. Ter cabelo misturado na pulseira da Yuu que a Yomi tricotou foi só o começo. Não demoraria muito para essa naturalidade ruir, uma vez que, como a própria Kagari acaba dizendo: O "coração" da Yomi morreu. Essa é uma forma figurada de dizer que a Yomi desistiu, pois enfrentar todo o sofrimento que ela estava tendo, sozinha, estava sendo demais para ela. Achei fantástico a forma que o anime nos diz como a Yomi se sente: Em um trabalho de arte, o professor diz para os alunos usarem qualquer coisa e a Yomi logo começa a cortar seus cabelos. Isso porque a Yomi se sente totalmente descartável, então usar seu próprio corpo não teria problemas, não faria falta. Ali eu senti que ela passou de um forte sofrimento para desenvolver algo bem mais próximo a uma depressão profunda mesmo. O Japão, até hoje, em 2021, é um país atrasado no quesito de cuidado psicológico, então casos como o da Yomi poderiam muito bem terminar em tragédias maiores. A mãe não faz absolutamente nada pela filha, a Kagari parece estar com o emocional cada vez mais distante da Yomi, coisa que o anime demonstrou para nós quando ela fala com a Mato sobre a Yomi ter "quebrado", sem parecer se importar muito, mas também sem malícia alguma, como se estivesse falando de alguém que ela mal conhece. A Mato lhe atingir com um tapa é até compreensível, visto que ela tem uma boa parcela de culpa para a situação ter chegado nesse ponto, mas foi um momento que disse mais sobre o quão aflita a Mato estava do que o quão culpada a Kagari é. A Mato agredir alguém já é algo bem fora do comum para a personagem, afinal.
Quando a Yuu questiona diretamente a Saya, a maior culpada, por ter causado esse estrago no psicológico da Yomi, o que eu me questionava antes, sobre a relevância da Yuu, foi confirmado de vez. O que a Saya faz com as garotas é injustificável, mas suas palavras são inegáveis. Ela define, de forma didática, uma das possíveis maneiras de se amadurecer, que é através da experiência. Claro, acaba sendo desproporcional e até por isso as ações dela são injustificáveis, mas diálogos como esse ajudam a entender mais profundamente a personagem quando chegar a hora dela ser realmente explorada. Mas chega a ser irônico ver um adulto indiretamente usando o velho argumento do "sofrimento formador de caráter" que muitos usam para justificar o bullying, por exemplo. Não é à toa que ela é a antagonista da história. Tão antagonista que enforcou a Mato "só de brincadeira", e eu digo isso literalmente, pois talvez ela veja na Mato, a protagonista, sua maior adversária. Ou seu maior alvo. Sua última peripécia foi guiar a Mato até o quadro que a Yomi estava pintando, para alavancar de vez o sentimento de culpa e de responsabilidade da Mato.
Quando a Mato revisita seu livro favorito mais uma vez, finalmente vemos como é o tal livro do passarinho e suas muitas, muitas cores. Quando o passarinho vai absorvendo todas as cores, ele eventualmente fica preto, cai e morre. Eu achei o conceito do livro muito bom, dá para interpretá-lo de diferentes formas, seja no contexto do episódio, do anime como um todo ou de forma geral. Aliás, o tema arte esteve presente durante todo o episódio. Da Yomi cortando seu cabelo para usar como arte, o quadro que a Yomi pintou, o livro do passarinho e a aula de literatura que vem logo em seguida. A Mato escreve incontáveis finais diferentes no seu livro do passarinho, rejeitando o final original ao associar essa história com o destino da Yomi. Aí, inteligentemente, temos alguns segundos da Mato na sala de aula enquanto a professora de literatura fala sobre o protagonista da história aceitar a morte, enquanto a Mato olha para a cadeira vazia da Yomi. A protagonista já não sabe muito para onde ir, mas também está fora dos seus planos aceitar a "morte" da Yomi.
O problema é que, antes de descobrir o que fazer em relação a Yomi, ela tem que descobrir o que fazer em relação a Yuu, que subitamente parece ter desaparecido da mente de todos na escola e até sua própria mente começa a ser afetada. Sem saber que tudo está meio que conectado, ela busca o que seria a casa da Yuu e chega a lugar nenhum, como se a casa dela nunca tivesse existido. No entanto, a Yuu aparece ali para fazer a grande revelação do episódio. Lá no episódio 1 eu trouxe a interpretação de que a outra realidade seria uma metáfora para as emoções das personagens, no episódio 2 eu questionei se a outra realidade não seria algo real. Mas, no fim das contas, acabou sendo a opção que eu nunca cogitei: As duas coisas. A Yuu confirma que a outra realidade é real e confirma que as alter egos são sim representações das emoções das personagens. Com isso, a perda de memórias traumáticas passa a fazer mais sentido e os conflitos emoções refletidos na outra realidade também. Não imagino que vá ter outra revelação em relação a natureza da outra realidade que mude o que a Yuu revelou nesse episódio, então fico mais tranquilo em saber que não vou precisar revisar minha leitura dos episódios anteriores, mas também fico feliz em ver que o anime está se mantendo narrativamente consistente até aqui. Em todo caso, a Yuu explica como a Black Rock Shooter matar a Dead Master pode salvar a Yomi, embora isso vá fazer ela perder os sentimentos que ela tem pela Mato. Mas, como dito no final do parágrafo anterior, a protagonista não iria aceitar a morte tão facilmente.
A luta entre a Black Rock Shooter e a Dead Master é intensa e parece muito mais pessoal que as outras, até em um nível físico mais ali para o final dela. A batalha narrativamente acompanha o núcleo sentimental das duas garotas representadas, Mato e Yomi. Isso é, a Black Rock Shooter tendo dificuldades em alcançar a Dead Master no começo, mas lentamente conseguindo chegar no seu alvo conforme as emoções da Mato vão encontrando um caminho. Em certo ponto, quando a Mato demonstra ter uma mentalidade que vai contra as ações da Black Rock Shooter, isso se reflete em um ferimento se abrindo na alter ego. Toda a coreografia da luta é ótima, até acima do que vem sendo, a animação é muito consistente e também em um nível a mais das outras, tanto que acabei tirando vários prints. O capricho visual acaba agregando muito no impacto de cada cena, principalmente nessa luta.
Sabendo que a Black Rock Shooter visa matar a Dead Master, a Mato aceita a sugestão da Yuu de se conectar mentalmente com a alter ego para mudar o rumo dessa história. É um paralelo bem legal com a cena anterior do livro do passarinho, pois o sentimento da Mato é o mesmo... E a ação também. O passarinho morre no final e a Mato escrever incontáveis alternativas no livro não muda realmente o que é o final do livro. Uma das leituras que se dá para tirar do livro é que ele trata, de forma simples, o que é a vida ou talvez o que possa ser a vida. Você é um passarinho branco, conhecendo o mundo, entra em contato com diferentes cores (Lembrando, cada cor representaria diferentes emoções) e absorve aquilo pra ti. O branco é a cor "pura", pois é a cor que pode virar qualquer outra cor, enquanto o preto é a cor final, que é quando não se pode virar mais nenhuma outra cor. Nesse sentido, o passarinho ficar preto e cair do céu provavelmente representa o final da vida, quando já experienciamos todas as cores, para o livro isoladamente. Mas esse sentido se distorce quando colocado no contexto complicado do anime, onde o passarinho ficar preto significaria que não tem mais volta, não importando as suas ações ou intenções. Isso acaba sendo o que acontece com a Mato quando ela se conecta diretamente com a Black Rock Shooter, pois acaba sendo tarde demais para impedir a morte da Dead Master e sua tentativa só serviu para fazê-la vivenciar aquilo em primeira mão. Na vida nem tudo vai sair do jeito que queremos, ou achamos correto, certo?
O conhecimento da Yuu sobre tudo isso ainda é um mistério, mas considerando que ela seja a última alter ego, vai ser curioso se tiver essa inversão de papéis da narrativa fazendo da Black Rock Shooter o "inimigo a ser parado". Voltando para o papel da Yuu na narrativa que eu citei antes: Ela a princípio tinha essa pinta de "amiga da protagonista que é figurante o anime inteiro", mas quando olhamos para trás chega a ser engraçado o quão bem ela é inserida na história sem revelar qual é o seu papel. Tipo uma obra de mistério que deixa várias pistas que só descobrimos após o mistério ser revelado, agora dá para ligar todos os pontos. O fato da Yuu ser a única amiga da Mato antes da Yomi aparecer parecia dizer algo sobre a Mato, mas também estava dizendo algo sobre a Yuu. A Yuu parecia já conhecer a Saya lá no primeiro episódio, apesar da Mato não conhecê-la. No episódio 2, quando a Mato vai buscar os conselhos da Saya, ela encontra a Yuu lá, que dá uma resposta evasiva sobre isso. Já no episódio 3, ela cita a frase da Saya sobre alguém carregar a dor delas e dizendo o quão legal isso seria se fosse verdade (Escrevendo assim começo a sentir que fui feito de trouxa pelo anime haha). Enfim, a Yuu saber de tudo e ter toda essa relevância é algo que vem sendo trabalhado nos bastidores do anime desde o início, o que mostra um enorme domínio dos roteiristas da obra tanto sob a história quanto sob a narrativa. Isso sem contar o auxílio enorme que a direção dá, com toda a linguagem visual. Por exemplo, no episódio passado eu falei do take da Mato com o brilho do pôr do sol no fundo representando a Mato como uma fonte de luz, certo? Pois após se conectar com a Black Rock Shooter e vivenciar a morte da Dead Master em primeira mão, essa fonte de luz se esvaiu.
Esse tipo de cena me dá tranquilidade para fazer essas leituras mais minuciosas e subjetivas de simbolismos porque não é um caso isolado, algo que colocaram ali por acidente. O anime inteiro é isso, tudo parece ter algum significado por trás e quando você analisa mais profundamente, as coisas se conectam de forma tão graciosa que chega a assustar. Mas assim como vários mahou shoujos lançados ao longo das décadas, esse episódio revelou seus segredos e agora chega na parte mais crítica da narrativa, que é onde existe a maior chance de errar a mão. Estou na torcida para que o nível se mantenha pelos próximos 3 episódios e que tenha um desfecho digno, pois as reviravoltas que vi aqui me deixaram com boas expectativas para a reta final. Saraba Da!
OBS: Eu voltei lá no episódio 1 para confirmar se a Yuu parecia ou não conhecer a Saya e fiquei boquiaberto com o fato da Yuu receber uma caneca com uma flor laranja e a Mato receber uma com estrelas azuis e roxas. Novamente, isso não é nem mais só um simbolismo, é um foreshadowing dando pistas para o desenvolvimento da trama. Impressionante.
E a paranoia de imaginar quantos foreshadowings desses eu perdi, fica como?? |