• Posted by : Testarossa segunda-feira, 17 de dezembro de 2018



    Já pararam para pensar que tudo que existe e virá a existir, um dia irá acabar?
    O fim, ou a morte, é inevitável independente da sua forma. Esses animes que vocês acompanham a todo momento um dia irão acabar, esse blog meu um dia irá acabar, esse post logo logo irá acabar. Tudo que tem um início, sempre terá um fim. É por isso que é importante você preservar o que é especial, e aproveitar a vida enquanto você a tem. Jamais deixe a ideia de que a vida não tem sentido e que o fim vir mais cedo ou mais tarde é só uma questão de estender seu sofrimento te consumir, é possível aproveitar a vida, principalmente se você tiver uma pessoa importante para você por perto.
    Esse é um dos principais temas abordados em Futari wa Precure: Splash Star (Me referirei apenas como “Splash Star” a partir daqui). Não só como uma mensagem que o anime quer passar, mas também como um aspecto importante tanto na narrativa quanto no universo do anime.

    Há muito o que se dizer sobre certos aspectos, temas e mensagens de todas as temporadas de Precure lançadas até então, porém, nenhuma misturou tais conceitos tão profundamente na narrativa da obra quanto Splash Star. Por isso, surpreendentemente, muitas coisas do anime são bastante subjetivas e ambíguas, coisas que não dão a resposta para o telespectador diretamente e faz-se depender da sua capacidade interpretativa e atenção para captar elementos muito bem enraizados no universo da obra. Como tal, no caso de você não conseguir pegar esses aspectos implícitos, tem grandes chances de você achar o anime mais simples do que ele realmente é, ou na pior das hipóteses, acreditar que deixaram alguns furos de roteiro onde na realidade é algo bastante subjetivo que só se explicaria com um pouco de reflexão.
    É claro, falando assim até parece que é um Serial Experiments Lain da vida, mas não é nenhum bicho de sete cabeças, ainda é um “anime para crianças”, afinal. Em todo caso essa review vai facilitar um pouco a sua vida. Espero.

    Splash Star é o terceiro anime da franquia de Precure, lançado em 2006. Também foi o primeiro anime de Precure a não envolver a timeline principal, de Futari wa Precure, e suas personagens. Além disso, a série serviu como protótipo de conceitos e padrões que foram oficializados em Yes! Precure 5 e posteriormente se tornaram uma das bases da franquia. Para minha surpresa Splash Star criou (Dentro da franquia) coisas que eu achei que eram novidades em temporadas recentes como Mahoutsukai Precure, de 2016.
    No entanto, Splash Star não vingou. A série foi bem fraca em audiência comparada com seu predecessor, não vendeu muito em termos de brinquedos e figures e o filme da mesma foi o que menos lucrou. Muito disso provavelmente se deu ao fato de terem tentado não se distanciar muito da primeira série em relação as protagonistas, Saki e Mai. As duas são bastante similares em aparência as protagonistas de Futari wa Precure, Nagisa e Honoka. Além disso, as personalidades delas também são similares, muito superficialmente, ao menos.

    E talvez o maior problema da série seja não ser mais explícita nos seus desenvolvimentos, conceitos, ideias e mensagens. Não que isso em si seja um problema, mas pelo tipo de anime que é, muitos inevitavelmente acabam ficando de guarda baixa e não presta muita atenção nesse tipo de coisa. Embora por outro lado isso seja algo presente na maioria das temporadas, em menor escala, então existe esses dois pontos de vista.
    As duas protagonistas possuem 3 ou 4 características primárias (Que são muito mais explícitas) iguais as das protagonistas de Futari wa Precure, mas, junto com o design, as similaridades acabam aí. As protagonistas de Splash Star, Saki e Mai, possuem um desenvolvimento muito sútil e natural, elas poucas vezes passam por um grande drama onde no fim mostra que elas mudaram e coisas do tipo que animes normalmente fazem. Pelo contrário, as mudanças delas são mais realistas e, de certa forma, profundas. Digo realista por ser algo muito mais ligado ao convívio e as experiências, é muito normal nós mudarmos nossa forma de ver algumas coisas, nossa forma de agir ou mesmo de pensar sem necessariamente passar por um grande conflito, mas sim só por estar convivendo com as “pessoas certas”. Eu mesmo vi isso acontecendo múltiplas vezes com amigos meus, e é uma sensação fascinante você de repente olhar para um amigo e perceber que ele agora age de uma maneira diferente do que era tempos atrás apenas por estar convivendo com você ou outra pessoa por muito tempo. Apesar de ser realmente sútil, foi algo que me marcou na série.

    Muito do que falei sobre o desenvolvimento das protagonistas se dá a um fator essencial em Splash Star: As relações entre os personagens. Splash Star foi um anime que realmente tornou tais relações muito orgânicas e palpáveis, não só entre as protagonistas, mas todos os personagens no geral.
    Existem diversos momentos em que você vê uma real naturalidade no comportamento dos personagens, é tudo bastante crível e isso é algo que admirei bastante na série. A Saki e a Mai são protagonistas bem incomuns na franquia, embora não individualmente, mas sim em tudo que envolve a caracterização e relação das duas. Elas possuem uma relação muito harmônica, e realmente parecem serem amigas de verdade, além de serem bastante carismáticas. O anime mostra muitos exemplos disso ao longo dos quase 50 episódios. Um exemplo super simples, porém eficaz, é que as duas visitam a casa uma da outra com certa frequência e logo, em um certo ponto até as famílias das duas passam a se conhecer. Isso é o tipo de coisa que também é real na relação com os demais personagens, o que os torna secundários na maioria das vezes bem agradáveis.

    Devido ao foco em como cada personagem se relaciona um com o outro, mesmo os vilões acabam sendo bem distintos em termos de personalidade. Alguns deles tem até muitas interações interessantes com as protagonistas. Infelizmente, devido a eles não ficarem normalmente no mesmo local, como normalmente acontece, não se tem muitas interações entre eles.
    Mesmo assim, é possível se tirar bastante da caracterização dos vilões baseado nas suas interações com qualquer outro personagem ao longo do anime, o que os torna mais interessantes e legais. O roteiro chega a dar passos arriscados, mostrando traços fortes da personalidade de alguns vilões através de momentos inusitados ou mesmo cômicos, e embora talvez em alguns casos acabe não dando tão certo, em outros acaba saindo algo realmente surpreendente.
    Porém, curiosamente, o inverso também pode ser considerado. Você consegue extrair certas características das protagonistas pelas suas interações com os vilões. Normalmente são em casos específicos e algumas vezes chega a ser difícil de notar de tão implícito que fica, mas o anime consegue mostrar fortes sinais de pensamento rápido, atenção aos arredores, ou até um pouco de sagacidade ocasionalmente. É o tipo de informação não exposta diretamente para quem está assistindo que adiciona camadas extras na caracterização das personagens.

    Splash Star não é um primor de animação, direção, design e etc. Claro, não há inconsistências graves e os picos de animação e coreografia são fantásticos, o que para um anime semanal de 50 episódios de uma franquia que estava ainda começando a dar seus primeiros passos é um grande feito. Porém, mesmo que limitados e o anime não sendo o sucesso que se esperava, deu para ver todo o cuidado que foi colocado em toda a parte visual do anime.
    O anime conseguiu deixar os aspectos visuais em sincronia tanto com o enredo quanto com a ambientação. Em um nível onde temos, por exemplo, foreshadowings deixados em momentos que não parece ter nada demais para ser visto, mas que depois de revelado quando você volta para ver tais cenas, nota a genialidade da equipe por trás do anime. Nós temos, por exemplo, um anime que fala muito sobre a natureza, pois a mesma é bem relevante para a história, e se passa em uma cidade de beira de praia, conseguimos sentir toda a ambientação do local através de cenários muito bem feitos e pensados com precisão. Nós temos, por exemplo, uma boa exploração do espaço nas lutas, onde algumas vezes as lutas começam em um lugar e terminam em outro.
    Graças a tudo isso combinado, você consegue visualizar mentalmente como a cidade é, o que tem nela e o seu tamanho no geral. Mesmo já tendo terminado de assistir há um tempo, eu ainda consigo lembrar de cabeça de vários locais da cidade, acho realmente muito bem feito nesse aspecto.
    Por ser uma cidade pacata cercada pela natureza, os elementos místicos do universo de Splash Star se misturam muito bem, e apenas um lugar assim representaria bem alguns aspectos importantes da narrativa, por isso digo que toda a equipe por trás do anime deve ter trabalhado em conjunto realmente, para conseguir chegar a este ponto.

    O roteiro de Splash Star é muito bem escrito, se aproveitando de muitos pequenos detalhes para criar algo grandioso, conseguindo fazer uma construção de mundo excelente e respeitando as leis daquele universo afinco até o fim. Há um dito (Do pai da Nagisa) que diz que existe vida em todas as coisas, inclusive objetos. Isso é algo bastante importante no anime, além de passar uma mensagem importante sobre você dar valor as coisas preciosas, cuidar delas sempre e realmente tratar com o respeito que merece as coisas que você preza. Muitos possuem coisas que consideram preciosas e ficariam realmente abalados caso as perdessem, há vida nesses objetos que zelamos simplesmente por eles existirem nas nossas memórias mais valiosas. Por isso a importância de ser uma cidade pacata ao invés de uma cidade grande. E é claro, como estamos falando de preservação, isso também se estende a própria natureza em si. Proteger o meio ambiente também é uma das mensagens por trás de Splash Star, e é quase sempre feito da melhor maneira possível: Não dizendo diretamente a mensagem que quer passar. Tem sim alguns casos onde isso fica mais explícito, mas normalmente o anime para e mostra a beleza da natureza de diversas maneiras diferentes, pois isso está diretamente ligado a vida em si.

    Em Splash Star existem dois mundos que possuem uma conexão, toda essa parte sobre a natureza é muito forte tanto em um quanto no outro. O nosso mundo se é referido como “Terra da Vegetação”, por exemplo. O outro mundo, mundo dos espíritos, é chamado de “Terra das Fontes”. O objetivo das protagonistas é recuperar as fontes sagradas que foram tomadas pelos vilões. A representação das fontes destruídas é basicamente de seca e a morte da vegetação, algo bastante simples, mas para o que a obra estava querendo fazer era funcional. Quando recuperadas, o anime oferece alguns cenários realmente muito bonitos, além de alguns detalhes extras que não posso entrar em detalhes para não dar spoilers.

    Mas sem entregar muita coisa, há algo que você precisa realmente ter conhecimento para entender mais profundamente a beleza de Splash Star. É um provérbio chamado 花鳥風月 (Kachou Fuugetsu).
    Kachou Fuugetsu traduzido literalmente é: Flores, Pássaros, Vento, Lua. Mas seu real significado é: Experimente as belezas da natureza e, ao fazê-lo, aprenda sobre si mesmo.
    Quatro palavras separadas que evocam os sentidos do olfato, audição, tato e visão, respectivamente. Justapostos desta maneira, eles sugerem a beleza do mundo natural como é experimentado diretamente, além da linguagem. As quatro palavras também aludem às quatro estações como aquelas convencionalmente simbolizadas na poesia japonesa.
    (Trecho em negrito tirado e traduzido daqui: http://zeninink.com/works/flowers-birds-wind-moon/)
    É isso, uma informação que fará bastante diferença na sua visão da obra e das personagens principais.

    Não é só sobre a natureza que o anime trata, mas também sobre a vida e a morte. Principalmente fala sobre viver. É um anime voltado para o público infantil, por isso certas coisas muito dificilmente, para não dizer jamais, serão colocadas em prática. Mas isso não impede de ensinar um pouco sobre a vida em si, em precisar cair em tons sombrios ou em melodrama. Como um anime que fala sobre a vida em si, mesmo sendo algo positivista, ele ainda precisa ter o pé no chão e ser realista quando necessário, por isso, algo que acho realmente excelente é que as protagonistas não estão imunes a falhas, a coisas ruins ou a simplesmente terem uma visão limitada sobre a vida em si.
    Em contrapartida, a morte, ou o fim, possui uma forma física dentro do universo de Splash Star. Isso não é algo realmente dito no anime, mas sim uma interpretação minha, porém tenho bastante convicção nessa interpretação. Tal morte é mostrada através do grande vilão da história, Akudaikaan, que é basicamente um gigante todo preto que pouco age no anime.

    É um pouco difícil falar sobre ele sem dar maiores spoilers, mas eu posso dizer que como um personagem, Akudaikaan é bastante simplório e basicamente sem personalidade, ele não é um vilão interessante per si. No entanto, seus defeitos, na minha visão, são propositais. Ele é a representação da morte, e a morte não é charmosa, cheia de personalidade e objetivos, mas sim algo seco que simplesmente vem para dar o fim na existência de algo ou alguém. Pode soar meio conveniente, mas existe um grande twist no final que faz o que eu disse ter total sentido, e vai muito além de ser apenas isso.
    É também muitas vezes levantada a questão de que tudo tem um fim, queira você ou não.
    Nós temos um núcleo de cinco vilões que antagonizam as protagonistas cada um em um arco, e cada um deles é baseado no Wu Xing, que são os cinco elementos chineses.

    Cada um dos vilões tem personalidades bem distintas e por cada um representar um elemento, os “monstros da semana” deles são temáticos baseado no elemento de cada um. Graças a ter um vilão diferente a cada 6 ou 7 episódios, a narrativa se torna mais dinâmica, e o ar de novidade se torna mais presente.
    Nenhum dos 5 vilões que representam os elementos chineses são realmente personagens complexos, mas eles são perfeitamente funcionais dentro da narrativa. 
    Por fim, temos Michiru e Kaoru, que são as personagens com o maior e melhor desenvolvimento do anime, carregam um bom nível de profundidade e a base do conceito visual das personagens trás uma interpretação genial e que pode vir a ser essencial para entender certos eventos supostamente inexplicáveis do anime.

    A segunda metade do anime de fato tem alguns pontos que “não tem” explicação lógica por trás, mas é compreensível se você entender certas coisas como metáforas para algo muito maior.

    Por ter o público alvo que tem, o anime pode frustrar um pouco em alguns casos especiais. Além disso, ele possui alguns episódios que não possuem muita utilidade e pode parecer um pouco filler, embora sejam raros os episódios assim, uma vez que estão sempre tentando aproveitar até os episódios menos relevantes para mostrar algo importante na narrativa.
    A trilha sonora é boa, porém pouco memorável e não muito impactante, salvo pelas versões instrumentais da abertura com violino ou piano, que são realmente muito bonitas.

    O anime constrói seu muito de maneira exemplar, fazendo não só com que as personagens, os poderes e os conceitos possam existir todos em harmonia lá dentro, mas também de maneira que permita que a própria narrativa funcione dentro do mundo em si, ao invés do contrário que seria o normal. Por isso, o anime é bem fechado, sem deixar brechas para coisas inexplicadas ou mal exploradas. Isso é, exceto todas as partes subjetivas que pesam mais para o lado metafórico do que o lado lógico.

    O roteiro ser muito bem escrito ajuda muito também, ainda que muito minucioso e repleto de nuances que algumas vezes necessita de coisas além da sua própria atenção e capacidade interpretativas, é um anime que é possível se aproveitar bastante. No entanto, saindo um pouco da caixa e refletindo sobre a obra em si, seus personagens e acontecimentos, é onde encontrará o quão incrivelmente bem-feita e profunda ela é. Admito que mesmo eu não enxerguei alguns dos foreshadowings muito bem colocados, acabei descobrindo por um acaso enquanto olhava outras reviews, e pessoas diferentes notavam pequenos detalhes extremamente inteligentes diferentes, então é bem provável que reassistir Splash Star vá me trazer uma percepção mais ampla do quão bem trabalhado cada detalhe foi.
    Infelizmente embora tenha dito que ajudaria, eu não poderia simplesmente dar grandes spoilers em uma análise, então muita informação e interpretação eu simplesmente optei por omitir. Mas é sempre bom frisar que nem todo defeito ou furo é realmente um defeito ou furo, vale pensar duas, três, até quatro vezes antes de decidir.

    Splash Star foi um anime brilhante, e sem dúvidas um dos meus favoritos de todos os tempos. Embora tenha alguns problemas bem óbvios e outros bem questionáveis, o carinho que tiveram nessa história para criar algo fascinante e muito bem construído acaba sendo maior que seus defeitos.
    E claro, se você chegou até aqui, vale lembrar que ainda é um anime voltado para o público infantil, mais especificadamente meninas, e como sempre pode ou não ter alguns elementos que incomodem. Não foi o meu caso, Splash Star foi só alegria e definitivamente merecedor de estar no meu top 3 animes. 
    Além dos spoilers omitidos, eu também provavelmente resumi muito ou deixei de falar sobre muita coisa, então talvez não tenha se tornado uma análise tão completa quanto eu gostaria, mas o importante é colocar a alma no que está fazendo, certo? Pois aqui está, espero que tenha sido uma leitura interessante. Saraba Da!

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